A palavra «apostasia» é uma transliteração da palavra grega apostasia, que originalmente denotava insurreição ou secessão. O seu uso religioso denota o abandono deliberado de uma religião. A apostasia está intimamente relacionada com a heresia na qual a rejeição das crenças e práticas ortodoxas a favor das heterodoxas dentro de uma determinada religião é vista como uma negação categórica da verdadeira religião. Assim sendo, a apostasia deve ser compreendida como uma ocorrência pública em vez de privada. A apostasia não é uma questão de dúvidas religiosas pessoais ou de práticas religiosas passadas. A apostasia é a renúncia e condenação pública de crenças e práticas religiosas anteriores pela pessoa. O apóstata muitas vezes abandona uma religião em favor de outra, mas ele pode renunciar à religião completamente.
III.I. A Apostasia no Judaísmo Helenístico
A Bíblia Hebraica condena com veemência a apostasia nacional dos antigos israelitas que, vez após vez, regressavam à religião e cultura politeístas de que tinham emergido. Porém os primeiros atos de apostasia individual ocorreram durante o reinado de Antíoco Epifâneo (
Posteriormente sob domínio romano, os judeus foram autorizados a praticar a sua religião livremente sob o domínio político nominal de uma tetrarquia judaica. Durante este período floresceram movimentos sectários, porém nenhum mais poderoso do que o movimento cristão que com o tempo se separou totalmente do judaísmo. Sectários e cristãos foram condenados como apóstatas. Além disso, tal apostasia foi condenada em termos políticos e também religiosos porque entre os judeus, a religião e a cidadania estavam fundidas. A apostasia era vista como um crime contra o estado e também como um pecado contra Deus. Ao apóstata era negada a salvação e a cidadania.
III.II. A Apostasia nas Religiões Pagãs
Em geral, a ideia de exclusividade era alheia às religiões grega e romana, dada a sua natureza politeísta. Os cultos pagãos não expulsavam membros que aderiam a tradições religiosas ou a círculos filosóficos rivais. Porém os deuses de religiões pagãs foram frequentemente reconhecidos oficialmente pelas autoridades civis e identificados com o
III.III. A Apostasia na Igreja Cristã
Muitos dos primeiros judeus e pagãos que se converteram ao cristianismo continuaram a cumprir a lei ritual judaica ou a participar nos festivais religiosos pagãos. Inicialmente, a persistência de costumes religiosos antigos não era considerada apostasia. A apostasia só se tornou um ponto de clivagem quando a igreja cristã se separou das formas judaica e gnóstica do cristianismo. Já no Novo Testamento, a apostasia está associada aos falsos professores e profetas cujo aparecimento assinalará o fim apocalíptico da era. Nos primeiros séculos, a apostasia era em grande medida um problema interno enquanto o cristianismo ortodoxo se separava de movimentos heréticos e cismáticos. Porém, com a conversão de Constantino, a apostasia
O abandono público do cristianismo era raro onde o vínculo entre a Igreja e Estado era firme, mas até mesmo os movimentos apóstatas secretos eram ativamente suprimidos. A tortura era usada livremente para obter confissões e encorajar desistência. Os apóstatas e os cismáticos eram excomungados pela Igreja e perseguidos pelo Estado.
Na história do cristianismo também houve apostasia em grande escala. O chamado «Grande Cisma» entre a Ortodoxia Oriental e o Catolicismo Ocidental, no
Além disso, aquelas igrejas protestantes que gozavam de monopólio territorial empregavam as armas de excomunhão determinada pela religião e de perseguição patrocinada politicamente contra os rivais que reivindicavam o cristianismo autêntico. Só com o fim das guerras religiosas e a promulgação de leis de tolerância é que foi posto fim a uma tal supressão política ativa da apostasia. Continuaram e ser impostas sanções religiosas, formais e informais, que iam desde excomunhão e deserdação até censura e expulsão.
Como esta breve visão geral demonstra, a condenação dos apóstatas servia de «estratégia de legitimação» para todas aquelas religiões exclusivistas do passado que reivindicavam ser a única religião possuidora da verdadeira crença e prática religiosa. Em ambientes nacionais e territoriais onde as lealdades políticas e religiosas estavam fundidas, eram impostas sanções judiciais e também religiosas contra a apostasia. O apóstata era privado de cidadania e também de salvação. Como tal, o apóstata era visto como um portador de falsidade e de imoralidade que ameaçavam a pureza da comunidade religiosa e a estabilidade da ordem política.
A apostasia passou a ser um problema cada vez menor no mundo moderno à medida que as tradições religiosas suavizavam as suas reivindicações dogmáticas e as sociedades seculares se tornavam independentes de aprovação religiosa. A aceitação do pluralismo religioso e a privatização da fé religiosa neste século libertaram grandemente os indivíduos que mudaram de religião do ódio religioso e judicial ao apóstata. É verdade que a Igreja Católica Romana ainda detém a arma de excomunhão, os Protestantes Fundamentalistas censuram os perigos de heresia, e ocasionalmente famílias devotas podem rejeitar filhos que se casam fora da sua fé ou se convertem a outra religião. Mas estas sanções não acarretam o peso público ou privado que acarretavam no passado. Elas são os gestos rituais de dogmatistas religiosos que perderam a sua autoridade incontestada nas culturas pluralistas e seculares.